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Quem pode usar os novos tênis da Balenciaga?
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Mas, por que lançar um sapato tão desgastado?
O estudante de moda e stylist, Matheus Vieira, afirma que gostaria de ter uma peça dessa no seu acervo, “justamente por conta do burburinho em torno da peça”, conta. Para ele, tudo não passa de “jogada de marketing” para aumentar a valorização da marca nas redes sociais, e gerar engajamento e discussão.
A consultora de moda e estilo, Ana Vaz, concorda com esse ponto de vista e afirma que isso faz parte de uma estratégia: as marcas estão buscando o consumidor jovem. Para ela, o jovem sempre vai buscar por uma quebra do padrão, do que é tradicional, portanto, pode se sentir atraído por um item considerado feio e desagradével. “Esse consumidor mais jovem tem estado cada vez mais distante do luxo”, explica ela, e por isso, as marcas têm se voltado para esse perfil.
Um perfil bem específico
Para um lançamento como esse, a marca pensou em um público-alvo, como afirma a consultora de moda. “Jovem, branco e rico, que não sofre com o preconceito do uso de nada que é destruído, puído, podrinho…”, reflete. Segundo Ana, não somente o preço, o preconceito e racismo também são fatores limitantes para o uso de itens com a aparência destruída, ou puídos com o tempo.
“É uma estética que só mantém seguro quem tem o privilégio de ser essa pessoa branca. Muitas vezes, você vai ter um jovem usando esse tênis muito surrado porque é a única opção que ele tem, e muitas vezes ele nem está seguro, fisicamente, podendo ser interpretado como alguém que é perigoso, que anda à margem da sociedade”, pondera.
A consultora de moda ainda aponta que mesmo que a marca não pense “na exclusão racial” implícita no lançamento, não a exime do racismo estrutural que existe dentro e fora do Brasil, evidenciando o padrão do corpo do público-alvo.
“Se você olhar o casting da Balenciaga, você vai ver diversidade racial, ela é uma marca que traz uma inclusão de modelos. Mas se isso inclui realmente as pessoas que são racializadas ou excluídas… Pode não ser um ato racista, mas ela não deixa de ter um olhar branco para o que é dito ‘luxo'”, afirma Ana.
A sociedade é formada por várias primeiras impressões. Segundo a consultora de moda, Ca?ren Cruz, essas peças também são uma oportunidade para refletir sobre o papel social da roupa, no dia-a-dia da população. Para a consultora é preciso pensar: quem poderia sair às ruas para procurar um emprego, para fazer network, para participar de ações e eventos utilizando peças destruídas?
Segundo Cáren, a cor do indivíduo ainda é um fator levado em consideração nesses julgamentos. “Quando uma pessoa negra usa marcas de luxo, dentro do contexto social do qual nós estamos, é automaticamente julgada, se levanta a concepção da dúvida se ela teria mesmo condições de estar com aquele produto”, afirma.
O luxo do lixo, ou ao contrário
Geralmente, o que diferencia um item de luxo de algo mais barato é justamente a qualidade e durabilidade de um item. Pode-se pagar mais caro por um produto que pode ser usado mais vezes sem ser substituído.
A Balenciaga alegou que fotografou os itens de uma maneira mais deteriorada do que eles vão ser entregues ao consumidor. Segundo a marca, a mensagem por trás disso é de que os calçados devem ser usados até o fim, mas muitos imediatamente associaram o produto ao lixo.
Mas como fica a consciência, quando um produto de luxo já chega desgastado na mão do consumidor?
“Você utiliza materiais que são nobres, que são recursos importantes de serem usados por mais tempo, os fragiliza e isso também vai diminuir o tempo de vida útil”, afirma a consultora de moda Ana Vaz.
Já a consultora de moda, Ca?ren Cruz, afirma que é consciencia e responsabilidade devem andar lado a lado, inclusive na hora de se vestir. “Um consumo politizado, uma postura cidadã de entender toda a cadeia onde as peças são produzidas, quem as fabrica, quem são os idealizadores, quem está por trás dessa marca, quem de fato a produz e qual é a responsabilidade das pessoas que estão na gestão”, pondera.
Terra.com.br