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Mercosul-UE: sem atenção às exigências europeias, só o acordo não garante nada


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A cláusula “princípio da precaução” que vai compor o acordo Mercosul e União Europeia (UE), por exigência destes, pode não ser o bicho de sete cabeças para os exportadores como o Itamaraty tenta transparecer, porém ainda sem mostrar os termos na íntegra negociados em Bruxelas. Mas uma coisa é certa: o tempo que levará para o acordo ser implementado na sua plenitude é o tempo que o Brasil terá para limpar todas as arestas sanitárias e ambientais monitoradas pelos europeus.

E aproveitar o acordo. Afinal, só o acordo não garante efetivamente o comércio

Pelas regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), o país que se diz prejudicado tem que provar tecnicamente. Pelo princípio da precaução, o ônus da prova é do exportador, que terá seus produtos barrados, por um tempo razoável, até que apresente sua defesa.

Ao impor essa cláusula, o que ajudou a acelerar o fechamento do acordo histórico, certamente a UE mirou os produtos de origem animal, justamente aqueles que não terão tarifas de importações zeradas (82% do total da agropecuária), mais arroz e milho cozido. E que são os mais passíveis de sofrerem barreiras sanitárias e comerciais na Europa.

“O Brasil terá que ir se ajustando, como faz atualmente sempre que os compradores exigem”, lembra Pedro de Camargo Neto, ex negociador internacional tanto enquanto esteve no Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) quanto como representantes das principais entidades de exportadores de carnes.

Para ele, a coisa é bem simples: pode haver normas internacionais aceitas, poderá haver normas aceitas no âmbito do acordo recém-firmado entre os dois blocos, pode haver o que houver de regulamentos em qualquer âmbito e em qualquer foro, mas na hora H os europeus fazem as regras deles.

Houve o caso da salmonela, que paralisou as vendas de cortes de frango da BRF e outras para a UE, na esteira da Operação Carne Fraca, vista pelo setor como protecionismo europeu já que prevaleceu uma interpretação deles e não de regras aceitas internacionalmente quando tal doença não tem impacto em humanos.

Crítico do passado recente nacional, de certo desleixo no trato das exigências dos grandes compradores de valor agregado – por definição, UE, Estados Unidos, Coreia do Sul e Japão -, Camargo Neto lembra o caso da rastreabilidade dos bovinos. O brinco exigido nos animais, com um chip marcando origem e identificação, é de difícil aceitação e atenção dos produtores, o que gera um vácuo nas exportações de carne com prêmio Europa ou cota Hilton, que o País nunca consegue atingir.

“Qual é a relevância de manter um brinco na orelha do animal por 90 dias? Mas é assim que eles querem”, completa Camargo Neto, também vice-presidente da Sociedade Rural Brasileira e conselheiro direto da ministra Tereza Cristina, embora negue oficialmente. Também foi consultor dela durante a montagem da pasta.

Pegar ou largar

Nessa questão de pegar ou largar, atendendo regras mesmo que de roupagem protecionista – voltando ao caso da salmonela, a França sempre teve interesse em retomar o protagonismo do comércio internacional de aves perdido para o Brasil -, ou ficar com o comércio mais confinado em regiões menos exigentes, como a Ásia, também há aspectos ligados aos estágios sócio-econômicos de cada nação.

Ênio Marques, ex-secretário da Defesa Agropecuária por duas vezes, e que participou de vários acordos sanitários internacionais, argumenta que a “tecnologia promove a exclusão”. Mais ou menos como dizer que os novos conhecimentos adquiridos vão mexendo no grau de limites do que é aceito ou não.

E naturalmente a Europa usa isso a seu favor e tenta não reconhecer nos outros essa mesma capacidade. Marques, hoje consultor, diz que o Brasil está capacitado para todas as exigências, inclusive com algumas harmonizadas até “erradamente” com a Europa.

Recorda ele que a legislação brasileira e a europeia não permite que se use determinados agentes para matar focos de contaminação de maneira mais imediata e eficaz, porque isso poderia mascarar questões relativas à higiene, por exemplo. Nos EUA, não, descoberto um foco, erradica-se no ato.

Em compensação, lá é aceito o uso de hormônio em bovinos. E na Europa e no Brasil, não.

Cotas

Seja como for e como será aplicada a cláusula “princípio da precaução”, o Brasil terá que fazer o máximo para atingir a sua parte na divisão de cotas a tarifas reduzidas com Paraguai, Argentina e Uruguai.

Em bovinos, da cota de 99 mil toneladas que vigorará, Uruguai e Argentina saem com mais vantagens diretas, pois já atingem a cota Hilton estabelecida para cada um, possuem rebanho europeu e a rastreabilidade é mais eficiente. Dizem que possuem acesso privilegiados à UE, mas não, ele atendem mesmo as exigiências.

Em aves, o Mercosul deverá ter cota de 180 mil toneladas, com vantagem expressiva para o mercado brasileiro, entre os maiores provedores mundiais.

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