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Intoxicação por agrotóxicos em escola de Sinop exemplifica impacto na saúde; pesquisadora alerta para revisão na legislação


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Alunos e professores passaram mal após pulverização realizada a menos de 90 metros de distância.

A contaminação por agrotóxicos, uma das consequências do avanço do agronegócio, fez novas vítimas em Mato Grosso. Dessa vez, crianças, professores e funcionários de uma escola municipal de Sinop, ao norte do estado, passaram mal e tiveram sintomas de intoxicação, após o contato com agrotóxicos lançados em uma lavoura próxima à unidade durante o período de aula. O caso foi registrado na última sexta-feira (02) e nesta quarta-feira (07), o produtor rural, que não teve a identidade divulgada, foi multado em mais de R$ 44 mil após constatação do uso irregular de agrotóxicos.

A instituição atingida é a Escola Municipal de Educação Básica (EMEB) Silvana, localizada na zona rural de Sinop, que possui cerca de 150 alunos. A unidade fica próxima de propriedades rurais, lojas de fertilizantes, dentre outros estabelecimentos ligados ao agronegócio da cidade. Ainda durante o período das aulas, os primeiros relatos de náuseas, dores de cabeça, dificuldades respiratórias e feridas pelo corpo começaram a surgir, com crianças e adultos passando mal e sendo levados para unidades de saúde.

Pesquisadora do Núcleo de Estudos Ambientais e Saúde do Trabalhador da Universidade Federal de Mato Grosso (Neast/UFMT), Marcia Montanari, explica que dependendo do volume, componentes e a interação dos agrotóxicos, os riscos à saúde podem ser diversos. No caso da EMEB Silvana, os relatos representam sintomas clássicos de intoxicação.

“Essas manifestações ocorrem nas primeiras 24 horas após o contato com o produto e a reação do corpo é imediata. Para além dessas intoxicações agudas, a contaminação pode desencadear intoxicações subcrônicas, que podem levar a processos neurológicos até 15 ou 20 dias depois. São muitos os efeitos crônicos deste tipo de contaminação que pelo cenário, acabam tornando-se cotidiana e continuada. Quanto mais se expõe ao processo químico degradante, maior é o risco do desenvolvimento de doenças.”

De acordo com um levantamento do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento divulgado no início deste ano, Sinop concentra o maior Produto Interno Bruto (PIB) entre as cidades mato-grossenses presentes na lista dos 100 municípios mais ricos do país. Com R$ 6,5 bilhões de produção, a cidade é um dos destaques do agronegócio do estado.

Até pela dimensão desta produção, não é raro que casos como o registrado na EMEB Silvana sejam minimizados pelo poder público. Em nota, a Prefeitura de Sinop informou apenas que um ônibus escolar encaminhou os estudantes para suas casas, “visto que não apresentavam sintomas”. Já aqueles que foram levados por responsáveis, ficaram aguardando na unidade. O órgão não confirmou a internação ou atendimento médico aos envolvidos, limitando dizer que unidades de saúde do município estariam de prontidão, “em regime especial, caso houvesse necessidade de atendimentos”. O texto cita ainda que o Instituto de Defesa Agropecuária do Estado de Mato Grosso (Indea) esteve no local e constatou que “a aplicação ocorreu na distância correta, preconizada em Decreto Estadual, acima de 90 metros, e que não haveria risco de contaminações no ambiente, visto que não houve contato direto do produto com a escola”.

No entanto, nesta quarta-feira (07), o Indea contrariou tal informação explicando que o proprietário da área será multado em R$ 44.178,00 (200 Unidades Padrão Fiscal de Mato Grosso – UPF/MT) “uma vez que foi constatada a utilização de agrotóxicos a menos de 90 metros da escola, o que está em desacordo com o Decreto Estadual 1651/2013”. O órgão informou ainda não ser possível listar quais os produtos utilizados na pulverização irregular, pois foram encontrados herbicidas, fungicidas e inseticidas no local. Além da multa, o proprietário também foi notificado a apresentar a documentação que comprove a legalidade dos agrotóxicos encontrados.

Uma denúncia do caso também foi registrada e protocolada junto à Promotoria de Justiça da Comarca de Sinop/MT.

Multas aplicadas passam de R$ 10 milhões

A proximidade da população em zonas rurais é um dos fatores que aumenta o risco de contato com componentes químicos, agrotóxicos e fertilizantes. São frequentes as denúncias e relatos de água contaminada, doenças de pele e respiratórias, alergias, dentre outras consequências à saúde. De janeiro a novembro deste ano, cerca de 44% das mais de 17,4 mil fiscalizações realizadas pelo Indea, foram referentes ao uso de agrotóxicos. As equipes atuam fiscalizando a proibição da aplicação terrestre mecanizada a uma distância menor que 90 metros de comunidades, cidades, vilas, bairros e mananciais de captação de água, moradias isoladas, agrupamento de animais e nascentes ainda que intermitentes. Até o momento, o total de multas aplicadas somente este ano já ultrapassa os R$ 10 milhões.

Porém, engana-se quem pensa que este risco está restrito somente a moradores de localidades próximas a pequenas ou grandes propriedades rurais. Segundo a pesquisadora Márcia Montanari, estudos em Mato Grosso já identificaram resíduos de produtos químicos e agrotóxicos não só nas populações do campo, como também entre moradores da cidade. “Conforme a velocidade do vento, temperatura e características do uso destes produtos, a deriva dos componentes pode chegar até 10, 15 km de distância. Temos registros de resíduos a até 30 km de distância do local de onde foi pulverizado. O que comprova que todos estamos cada vez mais expostos a essa contaminação, seja pelo ar, água ou alimentos”, acrescenta.

Em Mato Grosso, o limite terrestre para aplicação de agrotóxicos é de 90 metros, conforme o Decreto Estadual 1651/2013. A limitação está muito abaixo do que consta na Lei Federal 8.588/2006, que determina 300 metros para aplicação terrestre e 500 metros para a aérea. No final de 2020, o Ministério Público do Estado tentou suspender o decreto estadual após a apresentação de estudos que apontavam consequências graves do uso dos produtos para o meio ambiente e a saúde da população. Porém, o recurso não foi aceito pela Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo que decidiu manter a legislação no estado.

“O limite em Mato Grosso já está muito abaixo e ainda assim ele não é respeitado. Há relatos de pulverizações em lugares proibidos, fora dos limites, em áreas com residências. Este caso de Sinop é lamentável, mas serve para levar à discussão sobre o tipo de modelo produtivo que temos em Mato Grosso. Será que precisamos de tantos agrotóxicos? Pulverizar com aviões, algo que a União Europeia já proíbe? Temos que trazer essa discussão para a sociedade de maneira séria e ampliada, pois como é feito hoje não está mais seguro para ninguém”, alerta a pesquisadora Márcia Montanari, do Neast/UFMT.

Assessoria

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