Saúde
Infertilidade e depressão: Quais as ligações, os sintomas e como enfrentá-las
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A infertilidade pode ser angustiante e muitas pessoas experimentam crises de estresse, tristeza ou sentimentos de desesperança. Algumas, porém, chegam a ficar deprimidas. Uma pesquisa feita nos Estados Unidos, em 2015, encontrou uma alta prevalência de transtorno depressivo maior em pessoas que estavam recebendo tratamento para infertilidade.
Como a infertilidade está ligada à depressão?
Enquanto os médicos há muito entendem que a infertilidade é um problema de saúde, a vergonha e o sigilo continuam prevalentes entre as pessoas com infertilidade. Isso pode dificultar a busca de ajuda de amigos e familiares. Não engravidar depois de tentar por um período prolongado pode ser profundamente decepcionante e frustrante, especialmente sem o apoio dos entes queridos. Uma pesquisa de 2010 descobriu que a depressão pode impedir as pessoas de procurar tratamento para a infertilidade.
Embora muitas pessoas com problemas de fertilidade possam ter um filho após o tratamento, como a fertilização in vitro (FIV), a ansiedade sobre se o tratamento irá funcionar também pode prejudicar a saúde mental de uma pessoa.
“A infertilidade, do ponto de vista emocional, é vivida como uma perda, e toda perda pressupõe um luto. Esta perda pode ser vivida em diferentes momentos: quando se descobre que a gravidez muito provavelmente não acontecerá sem tratamento; quando há insucessos nos tratamentos e quando a gravidez é seguida pelo aborto”, afirma o médico Arnaldo Schizzi Cambiaghi, diretor do Centro de Reprodução Humana do IPGO.
“Os sentimentos depressivos indicam o fim da fase de raiva e revolta, comuns do primeiro momento, e o início de uma nova fase na qual há a possibilidade de suportar as frustrações sem ressentimentos e com menos hostilidade, e as projeções da raiva no mundo externo diminuem”, completa o médico.
Cambiaghi lembra que, apesar de ser uma fase necessária ao processo de elaboração emocional, é extremamente importante que o médico esteja atento para a intensidade e a permanência da paciente neste quadro. Caso os sintomas depressivos se intensifiquem, um aspecto mais severo de depressão pode se configurar. A indicação fármica e psicoterápica é extremamente benéfica e se faz necessária em tais situações.
Algumas das razões pelas quais as pessoas com infertilidade lutam contra a depressão incluem:
=Estresse: a infertilidade pode ser uma experiência estressante, particularmente quando há muita pressão sobre alguém para engravidar.
=Condições médicas: vários problemas médicos podem causar infertilidade, como a síndrome dos ovários policísticos (SOP) e também podem aumentar o risco de depressão. Um estudo de 2010 encontrou taxas mais altas de depressão e ansiedade em mulheres com SOP.
=Os desafios emocionais e físicos do tratamento: um pequeno estudo de 2014 com mulheres que procuraram tratamento de infertilidade ou serviços de preservação de fertilidade descobriu que a ansiedade e a depressão pioravam à medida que o tratamento progredia.
=Efeitos colaterais do tratamento: muitos medicamentos para fertilidade envolvem o uso de hormônios. Às vezes, esses podem afetar o humor de uma pessoa, aumentando o risco de depressão.
Qualquer um pode experimentar depressão por causa da infertilidade.
Sintomas
Não é incomum sentir-se triste ou deprimido ocasionalmente. No entanto, quando esses sentimentos persistem com o tempo e afetam a qualidade de vida de uma pessoa, ela pode estar sofrendo de depressão. Uma pessoa pode receber um diagnóstico de depressão quando tiver cinco ou mais dos seguintes sintomas:
=humor deprimido durante a maior parte do dia na maioria dos dias;
=perda de interesse na maioria das atividades, mesmo aquelas que aprecia;
=perda de peso ou ganho, não devido à dieta deliberada ou condição de saúde;
=dormindo muito ou pouco;
=sentindo-se fisicamente agitado ou lento na maioria dos dias;
=tendo baixa energia na maioria dos dias;
=sentindo-se sem valor, culpado ou envergonhado;
=dificuldade para pensar claramente ou se concentrar;
=pensamentos frequentes de morte ou suicídio.
Para um médico diagnosticar a depressão, os sintomas de uma pessoa não devem ser causados ??por medicação ou abuso de substâncias. Ele também deve pedir avaliação para outras condições de saúde mental. Se outra condição explicar com mais precisão os sintomas, o médico pode diagnosticá-la com essa condição e não com a depressão.
Quando procurar ajuda
Pessoas com infertilidade que sofrem de depressão devem procurar tratamento para ambas as condições. Embora a infertilidade possa ser a causa da depressão, é essencial tratar também os problemas de saúde mental.
Casais incapazes de engravidar depois de tentar por 12 meses ou mais devem considerar conversar com um médico sobre a infertilidade. No entanto, mulheres com mais de 35 anos devem consultar um médico caso não tenham conseguido engravidar após 6 meses de tentativas. Casais com história de infertilidade, mulheres com períodos irregulares e pessoas com problemas médicos crônicos, como diabetes, devem procurar um médico antes de tentar engravidar.
Um médico de família pode encaminhar homens a um urologista e mulheres a um ginecologista. Se os sintomas da depressão dificultarem a atuação de uma pessoa em casa, no trabalho ou na escola, elas devem procurar ajuda.
O desespero da depressão pode fazer as pessoas pensarem que o tratamento não funcionará. No entanto, isso também pode ser um sintoma de depressão. O tratamento pode, e muitas vezes alivia, os sintomas da depressão e melhora a qualidade de vida de uma pessoa.
Tratamento
Existem muitos medicamentos disponíveis que podem tratar a depressão. Os antidepressivos vêm em muitas formas, incluindo os inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS), os antidepressivos tricíclicos, os moduladores da serotonina e os inibidores da monoamina oxidase.
Algumas pessoas podem precisar experimentar vários medicamentos antes de encontrar um que funcione bem para elas. Ser honesto com um médico sobre quaisquer efeitos colaterais é essencial, pois o profissional pode alterar a dose ou o tipo de medicação.
A terapia também é uma maneira eficaz de tratar a depressão. Quando uma pessoa está em terapia, ela pode discutir seus sentimentos sobre a infertilidade, estabelecer metas e identificar estratégias para melhorar seu relacionamento. Alguns casais acham que a infertilidade prejudica seu relacionamento, portanto, participar de um aconselhamento em conjunto também pode ajudar.
Para a maioria das pessoas, a medicação e a terapia juntas oferecem os melhores resultados de tratamento. Um estilo de vida saudável, como manter uma dieta nutritiva e fazer exercícios regularmente, também é importante.
Alguns casais acham que um novo hobby ou atividade compartilhada pode ajudar. Ao lidar com problemas de fertilidade, é fácil se concentrar apenas em engravidar e negligenciar outros aspectos do relacionamento. Experimentar novas atividades, ter novas coisas para esperar e construir interesses compartilhados pode ajudar a reequilibrar a vida de um casal.
“A resistência em procurar um psicólogo ainda é muito grande pelos casais. Colocar o sofrimento em palavras, reviver sentimentos dolorosos é visto como algo muito penoso em um primeiro momento. É comum subestimar o impacto emocional ao longo do tratamento, principalmente quando há causas orgânicas absolutamente esclarecidas. Muitas pacientes ficam meses, às vezes anos com o número de telefone do psicólogo guardado em algum lugar até tomarem coragem para ligar”, explica Cambiaghi, que atende casais nessa situação há mais de 30 anos .
Ele enfatiza que a forma com que os profissionais da equipe de saúde encaminham os pacientes ao psicólogo pode facilitar ou dificultar essa procura. Quando os pacientes sentem que estão sendo encaminhados por estarem “problemáticos”, “dando trabalho”, isso só aumenta o estigma e o preconceito em relação às dificuldades mentais e a resistência na busca de apoio psicológico especializado. Sentem-se mais uma vez “incompetentes”, até para lidarem com suas emoções, e essa procura é dificultada.
“Porém, se o médico encaminha o paciente ao psicólogo de forma acolhedora, acreditando de fato que esse tratamento emocional terá eficácia em aliviar as angústias e ansiedades, aumentando o bem-estar e a qualidade de vida das pacientes, o caminho para a aceitação e procura de apoio psicológico especializado fica extremamente facilitado”, ensina o especialista.
Apoio
Embora a infertilidade seja comum, ela pode fazer com que uma pessoa se isole. Segundo pesquisa norte-americana, cerca de 6% das mulheres entre 15 e 44 anos não engravidam depois de um ano de tentativas. No entanto, a infertilidade não precisa durar para sempre, e o tratamento permite que muitas pessoas tenham bebês saudáveis.
Encontrar apoio de outras pessoas com experiências semelhantes pode ser útil. Elas podem oferecer recursos para controlar o estresse, manter um bom relacionamento e mostrar que ninguém está sozinho. Grupos on-line, como alguns privados do Facebook e fóruns de mensagens de fertilidade, também podem oferecer suporte.
“Não queremos que as pacientes deixem aspectos psicológicos implícitos na infertilidade tomarem conta da vida delas ou tirarem a energia e a esperança não só de continuar tentando a gravidez, mas, também, de viverem a vida em toda a sua plenitude”, afirma Cambiaghi, completando: “É preciso lembrar que não há apenas sofrimento e dor nos obstáculos que a vida impõe, mas também a possibilidade de encontrar força, saúde e resistência para enfrentar com coragem os novos desafios. Quanto maior o bem-estar, quanto maior a compreensão dos conflitos emocionais íntimos e profundos que a infertilidade provoca, menor a angústia e a ansiedade e maiores são as chances de o corpo encontrar um caminho ‘livre’ para a realização do desejo”.
Fonte: Arnaldo Schizzi Cambiaghi é diretor do Centro de reprodução humana do IPGO, ginecologista-obstetra especialista em medicina reprodutiva. Membro-titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, da Sociedade Brasileira de Cirurgia Laparoscópica, da European Society of Human Reproductive Medicine. Formado pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa casa de São Paulo e pós-graduado pela AAGL, Illinois, EUA em Advance Laparoscopic Surgery. Também é autor de diversos livros.