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Hospitais privados e filantrópicos demonstram interesse em participar do mutirão de cirurgias
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O Ministério da Saúde aprovou em 26 de janeiro a realização de um mutirão de cirurgias, exames e consultas especializadas em todo o território nacional. O programa promete liberar 600 milhões de reais aos estados e municípios para a redução de filas e começará pelas cirurgias, por conta da urgência em saúde. Além de utilizar a rede própria disponível no SUS, eles poderão contar com a participação de hospitais privados e filantrópicos de todo o Brasil.
As entidades que representam essas instituições — Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas (CMB) e a Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) — têm demonstrado esse interesse ao Ministério em reuniões que ocorreram ao longo de janeiro. Com o anúncio oficial da iniciativa, ambas reforçam a disponibilidade e aguardam os próximos passos para efetivar as parcerias.
“Sempre nos pareceu muito claro, desde o ano passado, que essa é uma situação insuportável, que só se resolve a partir de medidas extraordinárias, como um mutirão. E para se resolver vão precisar de uma mobilização de todos os hospitais do SUS e privados”, avalia Antônio Britto, diretor-executivo da Anahp.
O mesmo vale para a CMB. O presidente da entidade, Mirocles Véras, afirma que em conversas com a ministra Nísia Trindade e o secretário de Atenção Especializada à Saúde (SAES), Helvécio Miranda Magalhães Júnior, foi colocado à disposição do mutirão de cirurgias a participação dos hospitais filantrópicos e santas casas. “Para chegar a um índice de sucesso, indiscutivelmente tem que ter a parceria com a CMB”, aponta Véras.
A portaria que implementa o programa deve ser publicada nos próximos dias, e a partir dela os estados terão um período de 1 mês para elaborar um plano para a execução, listando os procedimentos que serão realizados, a meta para a redução da fila em 2023 e a lista dos serviços que irão compor essa estratégia. Os hospitais privados e filantrópicos aguardam essa publicação e as negociações com os gestores.
Demanda nacional
Estimativas do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) mostram que o Brasil tem cerca de 11,6 milhões de cirurgias represadas. A pandemia de Covid-19 é apontada como a principal causa desse acúmulo, já que com os serviços de saúde voltados para o atendimentos de pacientes com a infecção, parte das cirurgias consideradas não urgentes foram postergadas, assim como consultas e exames de rotina.
Contudo, Antônio Britto alerta que apesar da pandemia ter agravado o cenário, sempre houve uma fila no sistema público: “Há um desajuste no Brasil entre demanda e oferta de serviços, especialmente no caso do SUS. Isso só vai se resolver com mais recursos para o SUS, mais eficiência na gestão e melhor organização dessas filas. Há um desajuste estrutural e antigo que a pandemia apenas agravou, ela não criou”.
O Grupo de Trabalho de Saúde do Governo de Transição, que foi responsável por obter as informações da gestão Jair Bolsonaro e transmiti-las à equipe do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, já indicava em seu relatório a necessidade da “realização de um esforço concentrado nacional para reduzir filas de espera para diagnóstico e tratamento de doenças cardiovasculares, cânceres, cirurgias de baixa e média complexidade afetadas pela pandemia”, devendo ser realizadas ações dentro dos primeiros 100 dias do novo governo.
O Ministério da Saúde apresentou ao Conass e Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), durante a primeira reunião da Comissão Intergestores Tripartite (CIT), a proposta para a criação do Programa Nacional de Redução das Filas de Cirurgias Eletivas, Exames Complementares e Consultas Especializadas. A previsão é que R$ 600 milhões sejam destinados para a realização do programa, sendo em um primeiro momento R$ 200 milhões liberados para as cirurgias eletivas.
A expectativa de Mirocles Véras, da CMB, é que cirurgias cardíacas e oncológicas sejam as prioridades nesse mutirão, já que aumentam o risco de óbito e agravamento da doença caso sejam negligenciadas ou adiadas. Contudo, cada estado deve apontar quais os gargalos em suas regiões.
Estrutura dos hospitais para o mutirão de cirurgias
Os hospitais filantrópicos e santas casas já atuam nas cirurgias do SUS, representando 50% dos procedimentos públicos de média complexidade e 70% da alta complexidade, sendo o único equipamento de saúde em centenas de municípios. Por isso, essas unidades já contam com estrutura necessária para a realização de cirurgias, o que facilita a contratação desses serviços para a participação no mutirão de cirurgias.
“A grande maioria das nossas santas casas e hospitais filantrópicos giram com uma ocupação abaixo do limite de capacidade e a estrutura de centros cirúrgicos está montada. As unidades que vierem a integrar o mutirão podem colocar mais um turno para as cirurgias eletivas. Não teremos nenhuma dificuldade nas questões estruturais, de equipamentos, material e de pessoal”, defende o presidente da CMB.
O mesmo vale para os hospitais privados. Cerca de 30% das unidades com fins lucrativos realizam atendimento via SUS, de acordo com o levantamento Cenário dos Hospitais no Brasil 2021-2022, realizado pela Federação Brasileira de Hospitais (FBH) em parceria com a Confederação Nacional da Saúde (CNSaúde).
“Apesar de estarem com uma taxa de ocupação elevada, os hospitais privados têm horários e serviços que podem contribuir nesse mutirão. Não acho que haja dificuldades, é uma questão de em cada região haver um bom ajuste entre as necessidades e as facilidades das instalações e serviços existentes. Atender 1 milhão de pessoas nunca vai ser simples, mas é possível”, defende o diretor-executivo da Anahp, Antônio Britto.
Dificuldades
Se a questão estrutural não é uma dificuldade aos hospitais privados e filantrópicos, o que pode ser um entrave para a realização do mutirão junto a esses prestadores? De acordo com o presidente da CMB, Mirocles Véras, a questão mais sensível é o engajamento dos médicos para a participação e os valores que serão acordados, mas que com o apoio do Ministério e das entidades de profissionais é possível resolver.
“Os valores são muito pequenos e a maioria das cirurgias eletivas que são feitas dentro das nossas instituições não remuneramos o médico somente pela parte do SUS, existem outras ações que são feitas para ter um equilíbrio, como plantão e outros recursos de contratos com estados e municípios. Como serão somente cirurgias, temos a certeza que vai vir um valor compatível, se não for a busca da um valor justo, para que possamos fazer o mutirão sem prejuízos” explica Véras.
Segundo ele, em outras ocasiões houve o apoio do Conselho Federal de Medicina (CFM) para contribuir com a conscientização de profissionais para participarem de mutirões. Essa, inclusive, pode ser uma ferramenta utilizada nesse novo programa, principalmente se houver uma demanda maior que a disponibilidade de médicos.
Mirocles também aponta que o mutirão deve ser remunerado com base nos procedimentos que estão na tabela SUS. A defasagem dos valores, porém, deve ser contornada com incentivos federais. “A remuneração deve ser um, dois ou três valores a mais que a tabela SUS, para que possa viabilizar esses valores aos estados ou municípios repassarem à rede própria ou a instituições filantrópicas”, explica.
Expectativa e próximos passos
Outro alerta feito por Antônio Britto, da Anahp, é sobre o objetivo dos mutirões e a capacidade de enfrentamento desse tipo de programa aos desafios da saúde. Mesmo sendo uma ferramenta importante, não deve ser vista como a solução de todos os problemas:
“A gente não pode estabelecer expectativas acima do limite. O mutirão é a forma de resolver emergencialmente uma situação que saiu de controle, mas é óbvio que as filas não acabarão com os mutirões. Ainda que esta fila se resolva, novas filas estão sendo geradas porque existe, especialmente no SUS, falta de condições para atender a todos que demandam o seu serviço”.
Em 2022, o estado de São Paulo conseguiu reduzir em 52%, caindo de 538 mil para 254 mil pessoas em setembro daquele ano. Apesar de estar abaixo da meta estipulada, é preciso reconhecer o esforço empregado para diminuir a fila após o impacto da pandemia ao longo dos últimos 3 anos. O investimento anunciado foi de 350 milhões de reais.
Por isso, é muito importante que os estados elaborem seus planos e tragam o número de pessoas aguardando cirurgias, em diferentes especialistas, mais próximo da realidade. Existe uma dificuldade em se obter um número exato, que depende da organização dos diferentes entes que cuidam da saúde da população.
“Evidentemente em cada região brasileira é que vai ter que haver a definição de quem e como participa. É impossível ao Ministério da Saúde definir como vai ser o desenho objetivo do projeto estado por estado”, explica Britto. Agora, as entidades ligadas aos hospitais aguardam a elaboração desse plano para entender a demanda e começarem as negociações com os gestores.
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