O novo Congresso é considerado um dos mais renovados da história. O Senado renovou 59% das suas cadeiras, o mais alto índice pelo menos desde a redemocratização do país. Na Câmara, o percentual chegou a 52,5%, o maior desde 1994. Dos 567 parlamentares empossados em 1º de fevereiro, 118 deputados e dez senadores jamais haviam ocupado cargo eletivo.
Tamanha mudança de nomes, no entanto, não acabou com uma velha tradição, a de enforcar a semana quando há algum feriado no meio dela. O feriadão foi determinado pelos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). As últimas sessões destinadas a votação no Congresso foram realizadas na quarta-feira da semana passada (27), e as próximas estão marcadas para a próxima terça (12).
Procurado desde quarta-feira (6), Alcolumbre não foi encontrado pela reportagem em seu telefone pessoal. Sua assessoria de imprensa disse nesta quinta que não se trata de um “feriado prolongado”, uma vez que havia sessões não deliberativas – quando não há votações – no Congresso convocadas para hoje e amanhã (8). O senador, contudo, não retornou a Brasília após o Carnaval, tendo, ainda de acordo com sua assessoria, permanecido no Amapá. A previsão é que ele só volte à capital federal na segunda (11).
Rodrigo Maia também não retornou o contato da reportagem. Com a suspensão das atividades nesta semana, a Câmara adiou para a próxima a instalação das comissões da Casa, inclusive a de Constituição e Justiça (CCJ), primeira parada da reforma da Previdência.
Nesta quinta, no Senado, a sessão foi aberta pouco depois das 14h, apenas para discursos. Até as 15h30, apenas quatro senadores haviam registrado presença na Casa e se inscrito para falar: Izalci Lucas (PSDB-DF), Reguffe (S/Partido-DF), Jorge Kajuru (PSB-GO) e Marcos do Val (PPS-ES).
Na Câmara, neste mesmo horário, somente 17 deputados estavam por lá, segundo informações da Secretaria-Geral da Mesa. Sem o número suficiente de deputados na Casa, a sessão sequer chegou a ser aberta – para o início dos trabalhos no plenário, é necessário um quórum mínimo de 51 parlamentares, 10% da Câmara.
“Querer demais”
O senador Sérgio Petecão (PSD-AC), primeiro-secretário do Senado, uma espécie de prefeito da Casa, afirmou que seu gabinete no estado está cheio e completou: “Dizer que o Congresso tem que trabalhar no Carnaval é querer demais. Tem que ser realista. Ontem foi feriado [na verdade, o feriado foi na terça]. Ter que ir para Brasília hoje, para voltar para o estado amanhã é um gasto desnecessário”. O senador passa a semana no Acre.
Os parlamentares recebem R$ 33.763 mil por mês, considerando o salário bruto, sem descontos. Apenas em vencimentos, cada congressista ganha R$ 1.125,43 por dia, mais que um salário mínimo, que é de R$ 954. Pelo feriado prolongado de 12 dias sem trabalhos legislativos, cada parlamentar deve embolsar R$ 13.505,46.
A ONG Contas Abertas faz uma conta mais ampla: os sete dias úteis sem votação (quinta e sexta passadas, toda esta semana, com exceção de terça, que foi feriado, e a próxima segunda), de acordo com a organização, custam aos cofres públicos cerca de R$ 207,12 milhões.
O secretário-geral da instituição, Gil Castello Branco, explica ter chegado a esse número a partir da soma dos orçamentos da Câmara e do Senado, dividida pelos 365 dias do ano, multiplicada pelos sete dias úteis. Para ele, as sessões não deliberativas “são uma simulação de funcionamento” e “valeria inclusive colocar no cálculo os finais de semana”. “Se considerássemos somente os dias úteis ao calcular o valor de um dia do Congresso – R$ 29.589.041,09 –, esse número seria muito maior”, afirmou.
Renovação questionada
O cientista político Carlos Nepomuceno relativiza a renovação do Congresso, ponderando que, em muitos casos, os eleitos apenas migraram de cargos; em outros, vieram de famílias de políticos e já carregavam consigo um legado. “A renovação efetiva é muito menor do que os números dão a entender num primeiro momento.”
O especialista destaca uma “cultura enraizada”, não apenas nos congressistas, mas nos servidores, comissionados e demais funcionários que trabalham no local. “Já existe uma dinâmica bem estabelecida que leva tempo para mudar”, considera.
Para o cientista político Benedito Tadeu, as práticas continuam as mesmas porque o que carece de modificações é o sistema eleitoral. “Sem entrar no mérito das personalidades individuais, não basta mudar as pessoas, precisa mudar a estrutura de representação, o sistema de representação”, avalia.