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Mulheres vítimas de violência doméstica integram projeto para ajudar outros processos de superação


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Foi há um ano e meio, logo após o término de um relacionamento que durou três meses, recheado de violência psicológica, que a rondonopolitana Mel di Pietro passou pelo pior dia de sua vida. Em um encontro, ao reiterar que não queria mais o namoro, foi arrastada pelos cabelos e espancada. O caso ganhou repercussão nacional e hoje, após superar a depressão, mudar de cidade e de profissão, ela consegue ajudar outras mulheres que passam pela mesma situação por meio do projeto ‘Supere-se’, criado pela servidora de carreira da Secretaria de Segurança Pública de Mato Grosso (Sesp-MT), Sirlei Theis.

Mel chegou a publicar sua história nas redes sociais, e, apesar do apoio, também recebeu em troca muito julgamento. “Passei por um período de depressão profunda, vícios, me viciei em remédios para dormir, não saía de casa… eu vivi praticamente metade de um ano em cima de um sofá”, contou ao Olhar Direto.

Foi neste meio tempo que Sirlei escreveu um artigo sobre o caso dela, e as duas se encontraram nas redes sociais. Mel passou a integrar um grupo e mentoria online, no WhatsApp, e ali se sentiu acolhida. “Me ajudou a ver que eu poderia me libertar dessa dor se eu quisesse, que dependia só de mim, que eu não merecia estar passando por aquilo, que eu não era culpada”, lembra. “O Supera-se me ajudou a resgatar a minha autoestima, a ter minha confiança de volta, a ver que eu merecia ser livre e que eu posso ser feliz sozinha, independente de qualquer pessoa”.

Supere-se

A criadora do projeto, Sirlei (foto à dir.), também já foi vítima de violência doméstica. “Eu tenho formação em coach, sou advogada, sou da segurança pública, mas o principal motivo que eu comecei a fazer esse trabalho foi porque eu vivi um relacionamento abusivo, quase fui morta naquele relacionamento”, conta.

O agressor de Sirlei era conhecido na sociedade, ‘amigo de todos’ e, como era de se esperar, pagou uma fiança e foi liberado. “Eu sofri todos os tipos de abuso que se pode imaginar”, lamenta. “A mulher passa por isso, principalmente aquela da classe média alta, e ela sabe que a pessoa não vai presa”.

Ao contrário de Mel, o caso de Sirlei foi mais longo. O relacionamento durou anos, e ela conseguiu fugir três vezes, mas só se sentiu realmente segura e liberta quando passou no concurso da Sesp e fez amigos policiais. Desde então, ela passou por diversos cargos e, em 2018, foi inclusive candidata a vice-governadora na chapa de Wellington Fagundes (PR). “Uma das maiores superações que eu tive, foi que ele falava para mim que eu tinha que entender que eu não passaria de uma boa dona de casa. E em três anos e meio que eu estava longe dele, eu me tornei subsecretária de segurança pública do estado de Mato Grosso”.

Com toda essa força de superação pessoal, Sirlei fez cursos de coach, neurolinguística e treinamentos comportamentais, e começou a escrever artigos. Em 2015, após a publicação de um texto, muitas mulheres começaram a pedir sua ajuda através das mídias sociais. Foi aí que ela decidiu criar o projeto. “Muitas vezes essas mulheres estão vivendo num cárcere, e não têm como sair de casa para ir buscar ajuda”, afirma.

Foi neste mesmo ano que ela deixou o cargo na secretaria e passou a se dedicar mais ao projeto pessoal. Começou a fazer vídeos, escrever mais artigos sobre o tema, e criou uma palestra e uma mentoria online. “Era um grupo de apoio. Eu usei essas ferramentas que eu já tinha conhecimento para trabalhar a autorresponsabilização dessas mulheres, a autoestima, eliminação de crenças limitantes, trabalhar os sonhos… Porque essas mulheres, quando saem de um relacionamento desses, não conseguem se enxergar no espelho, não conseguem ter sonhos. Elas ficaram tanto tempo presas naquele relacionamento que não viviam as próprias vidas”.

Com a mentoria online, muitas vítimas conseguiram ajuda e, também, passaram a ajudar umas às outras. Uma delas, por exemplo, é a Mel. Agora, o objetivo de Sirlei é criar um projeto presencial. Em maio deste ano, ela visitou a ministra da Família e Direitos Humanos, Damares Alves, e apresentou sua ideia, que foi acatada. Em agosto, viajará a Brasília novamente para tentar o apoio.

Em Cuiabá, será lançado o projeto piloto no segundo semestre. “Serão encontros semanais, uns dez encontros, onde vamos trabalhar autoconhecimento, autorresponsabilização, sonhos, planejamento de vida, até orientação financeira e empreendedorismo”, explica.

Por aqui, ela tenta parceria com a Prefeitura e o Governo, para conseguir recursos públicos a serem investidos no projeto. “A ideia é que seja para mulheres que já saíram do ciclo, mas estão desestruturadas, com encaminhamentos pela delegacia e pelo judiciário. E também tratamento para o homem quando houver interesse, porque muitas vezes esses homens estão só replicando padrões que presenciaram na infância. Muitas vezes o abusador nem percebe que é abusador”. Caso a ideia dê certo, Sirlei quer oferecer treinamento para equipes do município e do Estado, que serão multiplicadoras destas ideias e dariam continuidade ao tratamento.

Até hoje, todo o trabalho prestado pela servidora foi feito voluntariamente. No entanto, outro projeto dela é montar um treinamento, junto a outras mulheres que já superaram relacionamentos abusivos, para ser comercializado.

“Ele não será um treinamento específico só para mulheres que passaram por isso, mas a gente vai preparar a mulher para que ela não corra o risco de entrar em um relacionamento abusivo. É preciso trabalhar a prevenção”, finaliza.

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