Featured
Supremo impõe restrições para fornecimento público de remédio sem registro na Anvisa
Compartilhe:
O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta-feira (22) impor restrições para que o poder público forneça medicamentos sem registro na Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Ao apresentarem os votos, os ministros tinham proposto regras diferentes. Quando a sessão foi retomada, após o almoço, eles entraram em um consenso sobre as condições específicas em que o remédio sem registro na Anvisa pode ser ofertado (veja mais abaixo).
O tribunal também considerou que o poder público não deve ser obrigado a fornecer medicamentos sem registro na Anvisa que estejam em fase de testes. Nesses casos, a situação será analisada individualmente.
O Supremo ainda estabeleceu que é possível o Estado ofertar o medicamento sem registro quando houver “mora razoável”, ou seja, se a Anvisa ultrapassar o prazo para análise do registro do remédio. O prazo é de 365 dias para remédios comuns e de 120 dias para aqueles voltados para doenças raras.
Outro ponto decidido na sessão desta quarta é que cidadãos que queiram judicialmente obter remédios sem registro devem acionar a Justiça Federal contra a União, e não contra estados e municípios.
Quatro ações sobre saúde estão na pauta do Supremo e envolvem outras discussões, que ainda serão finalizadas, como o fornecimento de remédios de alto custo que não estão na listagem de medicamentos gratuitos do Sistema Único de Saúde (SUS).
Outro tema a ser tratado é quem deve ser responsável pelo pagamento dos medicamentos, estados ou União. A sessão no tribunal deve continuar ao longo desta quarta no STF.
O julgamento começou em 2016, quando três ministros votaram sobre o tema: o relator, Marco Aurélio Mello, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin. Cada um deu um voto diferente, propondo condições para o fornecimento dos remédios.
Os dois casos – ações dos governos do Rio Grande do Norte e de Minas Gerais contra decisões que os obrigaram a fornecer remédios – têm repercussão geral. Com isso, o que o Supremo decidir valerá para todos os casos semelhantes que tramitam na Justiça.
Regras
Para concessão de remédios sem registro na Anvisa, os ministros entenderam que são obrigatórios três requisitos:
- Exigência de pedido de registro de medicamento no Brasil;
- exigência de registro em agências do exterior;
- inexistência de substituto terapêutico registrado.
Argumentos
Ao votar nesta quarta, o ministro Alexandre de Moraes disse que o poder público somente pode ser obrigado a fornecer o remédio sem registro se a Anvisa perder o prazo de 365 dias para avaliar o caso. Nos casos de doenças raras, esse período é de 120 dias.
“Não se trata de Estado contra indivíduo. A questão funda-se concretamente na necessidade de se validar jurídica e constitucionalmente as opções do Poder Público de se priorizar coletivamente o direito à saúde”, afirmou Moraes.
“Se trata de analisar, e isso às vezes em decisões vem sendo esquecido, que a arrecadação estatal é finita, que o orçamento é finito, e que a destinação à saúde pública igualmente é finita”, completou Moraes.
O ministro Ricardo Lewandowsi também votou a favor de permitir o fornecimento, com restrições: “Em princípio, não é possível exigir-se sempre um remédio que não consta na lista da Anvisa, mas, em circunstâncias excepcionais, isso pode sim ser deferido”, argumento Lewandowski.
O ministro Luiz Fux seguiu a mesma linha. Ele sustentou em seu voto que em casos excepcionais os medicamentos podem ser fornecidos.
“A Anvisa não é obrigada em princípio a fornecer os medicamentos não previstos na sua tabela, até porque não é judiciário que vai se imiscuir nessa matéria por falta de expertise e de capacidade institucional. Em segundo lugar é possível que nos casos excepcionais e naqueles em que há previsão de autorização especial que, aí sim, haja fornecimento de medicamentos fora da tabela da Anvisa desde que preenchidos os requisitos legais e jurisdicionais aqui fixados”, afirmou Fux.
Para a ministra Rosa Weber a regra deve ser o medicamento fornecido pelo poder público ter o registro da Anvisa. Para ela, casos sem registro devem ser a exceção.
“A regra é de que é indispensável o registro do medicamento na Anvisa, e que em nenhuma hipótese há possibilidade de requerimento em fase experimental, mas em situações, excepcionais permite-se, o que a própria Anvisa em sua própria normatividade prevê, permite-se que caso a caso eventualmente se chegue a uma conclusão diversa”, afirmou a ministra.
O que está em jogo?
STF retoma julgamento sobre remédios de alto custo para casos de doenças raras
A judicialização da saúde é hoje um dos principais temas do Judiciário brasileiro, afirmam recorrentemente ministros do Supremo. No caso dos medicamentos, há centenas de processos espalhados em tribunais de todo o país. A maioria dos casos envolve doenças raras, e o juiz determina a concessão do remédio.
Segundo dados do Ministério da Saúde, até 2016 o governo federal já havia cumprido 16,3 mil decisões sobre fornecimento de medicamentos.
De 2010 a 2015, houve aumento de 727% nos gastos referentes à judicialização dos medicamentos.
O caso chegou ao Supremo porque há dois princípios constitucionais diferentes defendidos por cada lado:
- O poder público argumenta que a concessão de medicamentos caros coloca em risco o fornecimento do básico para toda a coletividade e também diz que não há orçamento disponível para medicações caras para apenas uma pessoa;
- Já os doentes que precisam dos remédios argumentam que a vida delas depende daquilo e que os medicamentos são, na maioria das vezes, a única esperança de sobrevivência.
No julgamento, os ministros devem responder a dúvidas como:
- O poder público deve fornecer apenas medicamentos previstos na lista do SUS ou outros?
- É possível obrigar o fornecimento de medicamentos que não estejam registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)?
- Remédios em fase de testes também devem ser fornecidos obrigatoriamente?
- O paciente sempre deve comprovar não ter condições financeiras de comprar ou em todos os casos o poder público é obrigado a fornecer?