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Incontinência urinária: hora de fechar a torneira


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Não dá para tampar todos os vazamentos do prédio sem conhecer a sua tubulação. Analogias à parte, a falta de dados sobre as taxas de incontinência urinária no país fazia os experts daqui enfrentarem o problema no escuro. “Nós baseávamos as diretrizes de tratamento em estudos internacionais, que não necessariamente refletem a nossa realidade”, atesta o médico Carlos Bellucci, chefe do Departamento de Urologia Feminina da Sociedade Brasileira de Urologia.

Daí porque a primeira pesquisa de âmbito nacional sobre sintomas do trato urinário inferior – que vão da sensação de esvaziamento incompleto da bexiga ao escape de xixi – virou destaque no último Congresso Brasileiro de Urologia.

Ao englobar 5 184 homens e mulheres acima dos 40 anos de todas as regiões do Brasil, o levantamento desenha um cenário preocupante. “Confirmamos uma alta prevalência dessas condições em brasileiros. E mostramos que elas afetam bastante o bem-estar”, resume Cristiano Mendes Gomes, um dos autores do trabalho e urologista do Hospital das Clínicas de São Paulo.

Como era de esperar, as mulheres sofrem mais com a perda de xixi: 45,5% reportaram o quadro, ante 14,7% dos marmanjos. Entre elas, a versão mais comum é a incontinência urinária de esforço. “Pelo enfraquecimento da musculatura pélvica, gotas escapam quando a pessoa tosse, espirra, exercita-se, carrega peso…”, diz Gomes. Entre as causas estão o envelhecimento, múltiplos partos e cirurgias na região. Já na ala masculina, o pênis serve como uma barreira extra para segurar o líquido amarelo. Neles, o desconforto está ligado sobretudo a operações na próstata, embora esse efeito colateral dos procedimentos não seja frequente.

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 (Ilustrações: Francisco Martins/SAÚDE é Vital)

O tipo mais usual de incontinência entre os homens é o de urgência – e, mesmo nesse caso, as mulheres lideram o ranking. Trata-se de uma vontade repentina de fazer xixi, que às vezes não dá pra segurar até achar um banheiro. Ela pode, por exemplo, surgir em decorrência de distúrbios neurológicos como Parkinson, esclerose múltipla ou AVC. Porém, essa emergência sem aviso prévio costuma ser fruto de uma condição denominada bexiga hiperativa. Já ouviu falar dela?

Depois de ser produzido pelos rins, o xixi vai parar na bexiga. E, conforme ela enche, a musculatura que a envolve começa a contrair, disparando a vontade de tirar a água do joelho. Até aí tudo bem. Agora, quando esses músculos comprimem o órgão a todo momento, mesmo sem um acúmulo considerável de líquido, estamos diante da tal bexiga hiperativa. “A pessoa de repente fica com uma vontade intensa de urinar. Ela sai correndo para o banheiro sem nem esperar uns minutos até a reunião do trabalho terminar”, exemplifica Gomes.

Segundo o estudo brasileiro, a prevalência da encrenca é similar entre os sexos. A maior diferença está em suas consequências. Enquanto “só” 38% dos homens deixam escapar umas gotinhas em virtude do desejo súbito de urinar, 61% das mulheres acabam molhando as roupas íntimas por não controlarem esse ímpeto antes de encontrar um sanitário. A explicação para tamanha discrepância recai, de novo, na musculatura pélvica mais frágil e no fato de elas não contarem com um pênis para barrar a saída do xixi. “Mas a urgência por si só já pode piorar a qualidade de vida”, avisa o ginecologista Rodrigo de Aquino Castro, chefe do Setor de Uroginecologia da Universidade Federal de São Paulo. Aí que está: a incontinência não é, nem de perto, o único chabu das partes baixas a bagunçar o cotidiano.

Nenhum incômodo é normal

A lista de possíveis sintomas do trato urinário inferior (conhecidos pela sigla Luts, que vêm da expressão em inglês lower urinary tract symptoms) é grande. Além dos diferentes tipos de incontinência, encaixam-se nesse grupo de aborrecimentos: jato fraco ou espalhado, necessidade de acordar várias vezes à noite para se aliviar, sensação de esvaziamento incompleto, esforço excessivo para abrir as comportas do canal vaginal ou peniano…

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 (Ilustrações: Francisco Martins/SAÚDE é Vital)

E, dependendo da intensidade, as repercussões são inquietantes. “Alguns indivíduos se isolam por medo de fazer xixi na calça durante eventos sociais. Tanto que os sintomas urinários são associados a uma maior taxa de depressão“, observa Gomes. Já Bellucci lembra que, ao invadirem o período noturno, esses quadros prejudicam o sono, destrambelhando o organismo. “Há inclusive uma relação entre incontinência e fratura do fêmur, porque o idoso se apressa até o banheiro na madrugada, tropeça e cai no chão”, relata o urologista. Em resumo, não dá pra menosprezar esses perrengues.

Nem toda manifestação urinária exige tratamento médico. “Intervimos de forma aguda só nos cenários com um impacto negativo no bem-estar”, afirma Castro. Isso, contudo, não significa que você pode ignorar os escapes ou outros sintomas sob a alegação de que eles não incomodam. Embora a maioria dos sintomas venha de situações que não ameaçam a vida, existe uma pequena probabilidade de um problema sério desencadeá-los. Câncer, infecções ou, como dissemos, males neurológicos às vezes incitam o aparecimento dessas chateações. Até por isso o ideal é marcar uma consulta ao reparar em qualquer alteração do tipo. “Mas poucos brasileiros fazem isso”, lamenta Bellucci.

Uma vez excluída a presença de enfermidades graves, o tratamento começa com medidas comportamentais. A vítima da incontinência aprende a evitar bebidas diuréticas, como café e cerveja, a antecipar as idas ao banheiro e por aí vai. Eventualmente, ela recorre a fraldas, absorventes ou roupas íntimas descartáveis. E já pode agendar sessões de fisioterapia. “Usamos técnicas para fortalecer a musculatura do assoalho pélvico, responsável por fechar a uretra”, explica Dalila Duarte, fisioterapeuta do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo.

A meta também é ensinar o sujeito a contrair essa parte do corpo em tarefas do dia a dia que ocasionariam o gotejamento. Se não pular os encontros com o físio e cumprir as lições de casa, a chance de sucesso beira os 80%. Contudo, em pleno século 21 precisamos lidar com um tabu por trás do método. “Como ele envolve tocar nas partes íntimas, há quem se recuse afazê-lo. Fora que nem todo local oferece profissionais especializados em fisioterapia pélvica”, pondera Dalila.

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 (Ilustrações: Francisco Martins/SAÚDE é Vital)

O próximo passo terapêutico, no caso da incontinência de urgência, em geral é lançar mão de medicamentos que regulam as contrações da bexiga. “O número de remédios cresceu e chegaram opções com menos reações adversas”, comemora Castro. Isso é digno de nota se considerarmos que os fármacos antigos elevam mais o risco de boca seca e alterações cognitivas ou intestinais, que não raro inviabilizam a estratégia no longo prazo.

Se isso acontece ou se eles não dão conta do recado, o doutor tem à disposição a aplicação de toxina botulínica para impedir que a musculatura ao redor da bexiga a comprima. Ou um aparelhinho batizado de neuromodulador sacral, que é implantado na base das costas e emite sinais capazes de atenuar amovimentação involuntária desse órgão.

Já para a incontinência de esforço, há múltiplas técnicas cirúrgicas. A mais comum em mulheres envolve passar uma espécie de fita ao redor da uretra para reposicioná-la – com uma taxa de sucesso acima de 85%. Diante disso tudo, Bellucci dá um ótimo recado final: “O tratamento melhorou demais. O desafio, hoje, é garantir acesso a esses métodos para a população. E a nova pesquisa nos ajuda a colocar tais condições em foco e cobrar as autoridades”. Ufa!

Três motivos inusitados que levam à incontinência

Embora deixados de lado, eles contribuem para os vazamentos

  • Obesidade: a gordura de sobra pode acabar pressionando o reservatório de urina, o que eleva a possibilidade de escoamentos indesejados.
  • Constipação: trechos do intestino ficam bem próximos da bexiga. Logo, se estão repletos de fezes, prensam esse órgão ou nervos que disparam as contrações responsáveis pela incontinência.
  • Tosse crônica: problemas como a doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) culminam em acessos de “cof cof” que comprimem, lá embaixo, a musculatura do assoalho pélvico. E isso promove a saída da urina.
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