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Mato Grosso

Grilagem queima área equivalente a 4,2 mil campos de futebol em terra indígena de povos isolados de MT


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A Terra Indígena (TI) Piripkura teve uma área incendiada que equivale a 4,2 mil campos de futebol apenas em agosto deste ano. O número assustador acende o alerta para a extinção deste povo — atualmente com apenas dois sobreviventes conhecidos —, que enfrenta um longo processo de demarcação que se arrasta desde o fim da década de 80.

No total, a TI Piripkura apresentou uma área incendiada de 3,4 mil hectares em agosto, conforme aponta levantamento feito pelo Instituto Socioambiental (ISA), com base nos dados do painel Alertas+ e o Global Fire Emissions Databasem, e publicado nesta terça-feira (5). A organização não governamental (ONG) tem o objetivo de defender os bens e direitos dos povos indígenas do Brasil.

O boletim Sirad Isolados, outro monitoramento independente do ISA, também detectou que a TI Piripkura, localizada no noroeste do Mato Grosso, acumulou um total de 2.320 hectares desmatados entre agosto de 2020 e julho de 2021, o maior já registrado.

Mais de 1,7 milhão de árvores maduras foram derrubadas. Agora, a área sofre com a temporada de incêndios, que acontece após as primeiras chuvas na região. Neste estágio, invasores aproveitam o clima seco para “limpar” a área e transformá-la em pasto.

Segundo Ricardo Pael, procurador do Ministério Público do Mato Grosso, como o território Piripkura ainda não é demarcado, “está exposto a todo tipo de riscos e de degradação”. Ele acionou a Justiça Federal para exigir ações de proteção da Fundação Nacional do Índio (Funai).

Queimada na Terra Indígena Piripkura, ameaçada pelo avanço da grilagem no Mato Grosso. (Foto: Bruno Jorge)


Isolamento voluntário

De acordo com Pael, o caso preocupa por se tratar de um território de indígenas em isolamento voluntário. “Essa população tem menos contato com a sociedade no entorno e, com isso, menos recursos para noticiar às autoridades competentes violações aos seus direitos”, explicou.

A TI Piripkura é protegida desde 2008 por um dispositivo chamado Portaria de Restrição de Uso, que resguarda territórios que ainda não foram reconhecidos e demarcados, restringindo a entrada e o uso em razão da presença de indígenas em isolamento.

A portaria tem um período de validade que, normalmente, vai de dois a três anos. Entretanto, a última da Piripkura foi renovada por apenas um semestre.

“No período de seis meses você não consegue implementar medidas de fiscalização e uma operação da polícia para a retirada desses invasores. Conhecendo a morosidade dos órgãos federais de fiscalização, eles não conseguirão efetuar a retirada desses invasores”, pontuou Antonio Oviedo, coordenador do Programa de Monitoramento de Áreas Protegidas do ISA.

Inércia da Funai expõe indígenas a riscos

Segundo Oviedo, em julho, a pedido da Justiça Federal, a Funai fez uma operação de retirada dos invasores, mas que durou apenas três dias. Na época, o monitoramento detectou o início de um desmatamento de 500 hectares às margens da terra indígena. Ao fim da ação, madeireiros e grileiros voltaram ao interior da TI e seguiram com suas atividades criminosas.

“Existe uma grande área que está sendo destruída bem no coração da terra indígena, onde a cada mês o sistema independente de monitoramento do ISA detecta entre 300 a 500 hectares sendo degradados. Essa é uma taxa extremamente alta, que a gente não verifica em nenhuma outra TI na região”, explica Oviedo.

Segundo Elias Bigio, ex-coordenador-geral de Índios Isolados e de Recente Contato da Funai (2006-2011), os Piripkura demonstram estar fugindo das ameaças recentes. “Foi constatado que esses grileiros chegaram até a área onde os Piripkura estão refugiados, fugindo dos invasores, que são muito violentos”, revelou.

Uma amostra dessa degradação é que, em 2020, a terra indígena Piripkura, dentre os territórios com presença de povos isolados, foi a mais desmatada, de acordo com dados do boletim Sirad-Isolados. Foram 964,2 hectares desmatados, sendo 95% concentrados apenas entre agosto e dezembro.

O sistema de monitoramento utiliza imagens do radar Sentinel-1 e dos mosaicos PLANET/MapBiomas. O equipamento consegue adentrar a cobertura de nuvens mesmo no período de chuvas e assim captar variações na floresta, decorrentes das atividades de desmatamento.

Para Bigio, os indígenas estão sendo colocados em uma situação de vulnerabilidade pela própria Funai. “Os direitos indígenas, em particular do povo Piripkura, não são a razão para a publicação de uma portaria com prazo tão pequeno. Os invasores podem estar acreditando que a TI Piripkura não será demarcada na sua integralidade”, afirmou.

A expectativa de que a portaria não será renovada alimentou um “boom” de degradação do território e de pedidos de lavra minerária — que ainda não podem ser executados, mas ficam registrados na Agência Nacional de Mineração, gerando ainda mais especulações.

De acordo com os dados dos sistemas estadual e federal de Cadastros Ambientais Rurais (CARs), o território Piripkura possui 131.870 hectares de imóveis ilegais cadastrados em sobreposição, o que corresponde a 54% de seu território. Isso significa que a ocupação irregular acontece de forma deliberada e sem nenhuma fiscalização do Estado.

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